Você já parou para refletir sobre sua comida? O que realmente está ingerindo?
Vamos fazer um passeio para tentarmos esclarecer?
Então vamos nessa!
A FASE MAIS IMPORTANTE DA DIGESTÃO
A fase mais importante da nossa digestão ocorre no intestino delgado, quando a superfície mais extensa depara com o menor fragmento de alimento. Nesse local é decidido se toleramos lactose, o que é um alimento saudável ou que tipo de comida provoca alergias.
Nessa última etapa, nossas enzimas digestivas trabalham como minúsculas tesouras. Vão recortando a comida até ela chegar ao mínimo denominador comum com as células do nosso corpo.
O truque da natureza é que todas as coisas consistem nos mesmos materiais fundamentais: moléculas de açúcar, aminoácidos e gorduras. Todos os nossos alimentos provêm de seres vivos – pela definição biológica, entre eles estão tanto uma macieira quanto uma vaca.
AS MOLÉCULAS DE AÇÚCAR – COMIDA
Moléculas de açúcar podem ligar-se a cadeias complexas. Nesse caso, já não têm o gosto doce e constituem os chamados carboidratos, presentes em alimentos como pão, macarrão ou arroz.
Quem digere uma torrada recebe, após o trabalho de fragmentação realizado pelas enzimas, o seguinte produto final. A mesma quantidade de moléculas de açúcar encontrada em algumas colheres de açúcar branco.
A única diferença está no fato de que o açúcar comum não necessita de um grande processamento por parte das enzimas, pois chega tão fragmentado ao intestino delgado que pode ser diretamente absorvido pelo sangue. Muito açúcar puro de uma só vez adoça nosso sangue por um curto período.
O açúcar da torrada clara é digerido pelas enzimas com relativa rapidez. Já com o pão integral o processo é bem mais demorado. Ele consiste em cadeias muito complicadas, que têm de ser desmontadas pedaço por pedaço.
ASSIM…
Em vez de ser uma bomba de açúcar, o pão integral é um depósito benéfico dessa substância. De resto, o corpo precisa reagir de maneira muito mais intensa a uma edulcoração repentina para trazer tudo de volta a um equilíbrio saudável.
Por isso, libera grandes quantidades de hormônio, sobretudo insulina, fazendo com que, passada a operação especial, logo voltemos a nos sentir cansados. Quando o açúcar não é absorvido rápido demais, ele é um importante recurso natural.
Podemos utilizá-lo como combustível para nossas células. Assim também para produzir estruturas próprias de açúcar, como os glicocálices em forma de galhos de veado em nossas células intestinais.
Apesar disso, nosso corpo gosta de doce açucarado, pois assim economiza trabalho. Justamente porque esse tipo de açúcar é de absorção mais rápida, tal como as proteínas quentes. Acrescente-se a isso que o açúcar é convertido em energia a uma velocidade muito elevada. Por sua vez, este bem-sucedido fornecimento de energia é recompensado pelo cérebro com boas sensações.
ARMADILHA AÇUCARADA
Nunca na história da humanidade tivemos de lidar com uma oferta tão excessiva de açúcar. Nos supermercados americanos, cerca de 80% dos produtos industrializados são acrescidos de açúcar. Portanto, do ponto de vista da técnica da evolução, nosso corpo acabou de encontrar o esconderijo de comida doce e se empanturra inocentemente, antes de desmoronar no sofá com um choque de açúcar e dor de barriga.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o quarto maior consumidor de açúcar no mundo (12 milhões de toneladas/ano).
Ainda segundo a entidade, os brasileiros consomem 50% a mais de açúcar do que o recomendado. Isso significa que, por dia, cada brasileiro, consome, em média, 18 colheres de chá do produto (o que corresponde a 80g de açúcar/dia), quando o recomendado pela OMS seria até 12 colheres.
Embora saibamos que não faz bem ficar beliscando muitos doces, não podemos levar a mal nossos instintos se eles aproveitam a ocasião com entusiasmo. Se ingerimos comida com açúcar demais, simplesmente o armazenamos para períodos difíceis. No fundo, é um procedimento prático.
ARMADILHA AÇUCARADA
Por um lado, fazemos isso remodelando-o em cadeias de açúcar muito longas e armazenando-o como glicogênio no fígado; por outro, transformando-o em gordura e acumulando-o no tecido adiposo.
O açúcar é a única substância que nosso corpo consegue utilizar com pouco gasto de energia para produzir gordura.
Depois de alguns instantes de corrida, as reservas de glicogênio são consumidas. Bem no momento em que se pensa: de repente essa corrida ficou cansativa. Por isso, os fisiologistas da nutrição aconselham que se pratique no mínimo uma hora de atividade física quando se quer perder gordura.
No mais tardar, após a primeira diminuição do desempenho, as nobres reservas são efetivamente extraídas. Talvez fiquemos irritados com o fato de que a gordura abdominal não vá logo embora. Mas nosso corpo não entende essa irritação, afinal, as células humanas veneram a gordura.
GORDURA – COMIDA
De todas as partículas alimentares, a gordura é a substância mais eficiente e valiosa. Os átomos são agrupados de maneira tão inteligente que a gordura – em comparação com os carboidratos ou as proteínas – consegue reunir o dobro de energia por grama. Nós a utilizamos para revestir os nervos, tal como os invólucros de plástico ao redor dos cabos elétricos.
Graças a esse revestimento, pensamos com mais rapidez. Alguns hormônios importantes no nosso corpo são feitos de gordura. Além disso, cada uma de nossas células é envolvida em uma membrana gordurosa.
Uma substância tão importante como essa é protegida, e não dissipada logo no primeiro e curto sprint. Caso sobrevenha mais um período de carestia – e foram muitos nos últimos milhões de anos –, todo grama de gordura abdominal torna-se um seguro de vida.
Para nosso intestino delgado, a gordura também é algo muito especial. Como os outros nutrientes, não pode simplesmente sair do intestino e ser absorvida pelo sangue. A gordura não se dissolve em água. Ela poderia obstruir os minúsculos vasos sanguíneos nas vilosidades do intestino delgado e boiar nas veias como azeite na água do espaguete. Por isso, a absorção da gordura ocorre de maneira diferente: através do sistema linfático.
SISTEMA LINFÁTICO
Os vasos linfáticos são para os vasos sanguíneos mais ou menos o que o Robin é para o Batman. Todo vaso sanguíneo no interior do corpo é acompanhado por um vaso linfático. Assim como toda pequena veia no intestino delgado.
As veias são espessas e vermelhas e bombeiam heroicamente os nutrientes para nossos tecidos. Os vasos linfáticos são finos, de esbranquiçados a transparentes. Eles recuperam no tecido o fluido bombeado e transportam células imunocompetentes para prover todas as partes com o que é necessário.
Os vasos linfáticos são muito frágeis porque não possuem paredes musculosas como nossas veias. Com frequência, trabalham com a força da gravidade. É por isso que de manhã, quando acordamos, nossos olhos ficam inchados.
Na posição deitada, a gravidade não consegue fazer muita coisa. E, embora os pequenos vasos linfáticos do rosto fiquem abertos de bom grado, somente quando nos colocamos em pé é que o fluido que durante a noite foi transportado para esse local pode voltar a fluir para baixo. Após uma longa caminhada, nossas pernas não se enchem de líquido, pois, a cada passo, seus músculos comprimem os vasos linfáticos, fazendo com que a água dos tecidos seja mandada para cima.
Em todo o corpo, a linfa está entre os subestimados fracos – a não ser no intestino delgado. Nele, ela faz sua grande aparição! Todos os vasos linfáticos confluem para um vaso consideravelmente largo. Lá, podem reunir toda a gordura acumulada, sem o risco de obstrução.
O DUCTO TORÁCICO
Poderíamos apresentá-lo da seguinte forma: “Viva o ducto! E que ele nos ensine por que a gordura nobre é tão importante, e a ruim, tão nociva!” Logo após uma refeição rica em gordura, encontram-se no ducto tantas gotas minúsculas de gordura que o fluido deixa de ser transparente para adquirir um aspecto leitoso, que recebe o nome de quilo.
Tanto os homens quanto as mulheres o possuem. Depois que se acumula no ducto, a gordura faz uma curva no abdômen, atravessa o diafragma e vai direto para o coração. Nele é vertido o líquido acumulado das pernas, das pálpebras e do intestino. Portanto, seja o nobre azeite de oliva, seja a gordura resultante de uma fritura barata, tudo é despejado diretamente no coração. Antes disso, não há nenhum desvio pelo fígado – como acontece com todas as outras coisas que digerimos.
A desintoxicação da gordura perigosa e ruim só ocorre depois que o coração já bombeou tudo com força e que as gotas de gordura chegaram por acaso a um vaso sanguíneo do fígado.
Este órgão abriga muito sangue, razão pela qual é alta a probabilidade de logo ocorrer um encontro. Mas antes o coração e os vasos ficam entregues, sem nenhuma proteção, ao que se pode adquirir no McDonald’s e companhia pelo menor preço.
GORDURA BOA E GORDURA RUIM – COMIDA
Assim como a gordura ruim pode fazer mal, a boa pode ter efeitos maravilhosos. Quem gastar um pouco mais com um verdadeiro azeite de oliva (extravirgem) prensado a frio, molhará sua baguete em um bálsamo benéfico para o coração e os vasos sanguíneos.
Muitos dos estudos sobre o azeite de oliva sugerem que ele é capaz de proteger-nos da arteriosclerose, do estresse celular, do Alzheimer e de doenças oculares (como a degeneração da mácula). Além disso, veem-se efeitos positivos no caso de doenças inflamatórias, como na artrite reumatoide, e na prevenção a determinados tipos de câncer.
Não somos os únicos a nos beneficiar do azeite de oliva; nossas bactérias intestinais também gostam desse pequeno cuidado.
Um bom azeite de oliva pode até custar um pouco mais, mas não tem gosto rançoso – ao contrário, é verde e frutado – e, ao ser engolido, às vezes causa uma sensação de aspereza devido ao tanino. Quem achou essa descrição abstrata demais pode consultar os diversos selos de qualidade nas boas garrafas.
FIQUE LIGADO
Verter alegremente o azeite de oliva em uma frigideira não é uma boa ideia, pois o calor estraga muita coisa. Embora as bocas quentes do fogão deixem o bife e o ovo uma maravilha, não são boas para os ácidos graxos oleicos, que podem ser quimicamente alterados.
Os azeites nobres não apenas são sensíveis ao calor, como também apanham radicais livres no ar. Os radicais livres causam muitos danos ao nosso corpo porque, na verdade, não gostam nem um pouco de ser livres, preferindo estar firmemente presos a algum lugar.
Desse modo, ligam-se a tudo que é possível – vasos sanguíneos, pele do rosto ou células nervosas –, causando rompimento de vasos, envelhecimento da pele e doenças nervosas. Se quiserem se prender ao nosso azeite, tudo bem, mas, por favor, só ao nosso corpo, e não à nossa cozinha. Por isso, é importante fechar bem a garrafa depois de usá-la e guardá-la na geladeira.
GORDURA ANIMAL E GORDURA VEGETAL
A gordura animal presente na carne, no leite ou nos ovos contém muito mais ácidos araquidônicos do que os óleos vegetais. A partir dos ácidos araquidônicos, nosso corpo produz sinais químicos hiperalgésicos.
Em contrapartida, em óleos como o de canola, linhaça ou cânhamo, há uma quantidade maior de ácidos alfalinoleicos, que são anti-inflamatórios. Enquanto no azeite de oliva encontra-se uma substância com efeito parecido, conhecida como oleocanthal. Essas gorduras agem de modo semelhante ao ibuprofeno ou à aspirina, só que em doses muito menores.
Portanto, não ajudam em caso de dor aguda de cabeça. Mas um uso regular delas pode ajudar quando se tem uma doença inflamatória. Ou ainda, se sofre com frequência de dores de cabeça ou resultantes da menstruação.
Às vezes, as dores se atenuam quando se passa a consumir mais gordura vegetal do que gordura animal.
EXCESSO DE GORDURA NO CORPO
No corpo também pode haver excesso de gordura, que, quando em excesso – não importa se é gordura boa ou ruim –, ultrapassa nossas capacidades. É como passar creme demais no rosto. Os fisiologistas da nutrição recomendam suprir de 25% a 30% da necessidade diária de energia com gordura. Isso equivaleria, em média, a 55 até 66 gramas por dia. Pessoas de grande porte que praticam esportes podem consumir um pouco mais. Enquanto as de constituição física menor e mais sedentárias devem consumir menos.
Depois dos carboidratos e da gordura, agora só falta a terceira e talvez mais desconhecida pedra fundamental da nossa comida: os aminoácidos.
AMINOÁCIDOS – COMIDA
É estranho imaginar, mas o tofu de sabor neutro ou semelhante a nozes ou a carne condimentada e salgada consiste em meros ácidos pequenos. Como no caso dos carboidratos, os pequenos tijolos são alinhados em cadeia. Por isso, têm um sabor diferente e acabam recebendo outro nome: proteína.
No intestino delgado, as enzimas digestivas desmontam a estrutura, e a parede do intestino apanha os fragmentos valiosos. Existem vinte desses aminoácidos e infinitas possibilidades de combiná-los com as mais diferentes proteínas. Entre muitas outras coisas, nós, humanos, construímos a partir disso nosso DNA. Nosso patrimônio genético, a cada nova célula que diariamente produzimos.
Outros seres vivos fazem o mesmo, quer sejam plantas, quer sejam animais. Por isso, tudo que consegue se alimentar na natureza contém proteína. Contudo, seguir uma alimentação sem carne nem sintomas de deficiência é mais difícil do que muitos imaginam. As plantas constroem proteínas diferentes das dos animais e muitas vezes utilizam tão pouco um aminoácido que suas proteínas são consideradas “incompletas”. Se quisermos construir nossas próprias proteínas a partir dos seus aminoácidos, só avançaremos na cadeia até um aminoácido nos escapar!
AMINOÁCIDOS – COMIDA
Proteínas incompletas acabam sendo destruídas, e eliminamos os pequenos ácidos através da urina ou os reciclamos de alguma forma. Ao feijão falta o aminoácido metionina ; ao arroz e ao trigo falta a lisina ; ao milho chegam a faltar dois: a lisina e o triptofano!
Mas este não é o triunfo dos amantes da carne sobre as pessoas que não consomem esta comida: vegetarianos e veganos só precisam fazer combinações mais inteligentes. Embora o feijão não contenha metionina , tem uma enorme quantidade de lisina – uma tortilha de trigo com pasta de feijão e um belo recheio fornece todos os aminoácidos necessários para se produzirem as próprias proteínas.
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Quem come ovo e queijo também consegue equilibrar as proteínas incompletas. Em muitos países, há séculos as pessoas fazem suas refeições de maneira totalmente intuitiva, e as complementam da seguinte forma: arroz com feijão, macarrão com queijo, pão pita com homus ou torrada com manteiga de amendoim. Teoricamente, a combinação nem precisa ser feita em uma mesma refeição; basta que ocorra ao longo do dia.
Há também vegetais que contêm todos os aminoácidos importantes em quantidades suficientes. São eles a soja, a quinoa ou ainda o amaranto, as algas espirulina, o trigo sarraceno e as sementes de chia. Por isso, o tofu tem direito à sua fama de substituto da carne. Mas com a limitação de que cada vez mais pessoas apresentam reações alérgicas a ele.
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REFERÊNCIA:
O discreto charme do intestino, Enders, G. umfmartinsfontes, São Paulo, 2015.